quarta-feira, 15 de junho de 2011

Crianças Sobredotadas

Crianças sobredotadas

Crianças sobredotadas

Não ignore os sinais de alerta



Estima-se que 3 a 5% das crianças e adolescentes que frequentam as escolas nacionais são sobredotados. A maioria está por identificar. Muitos são apenas percebidos como hiperactivos, desinteressados ou como alunos incómodos, em conflito com o próprio ensino que não corresponde às suas expectativas. Em entrevista à Bebé Saúde, a Doutora Helena Serra, presidente da Assembleia-geral da Associação Portuguesa de Crianças Sobredotadas (APCS), psico-pedagoga especializada em Educação Especial fala-lhe sobre o mundo destas crianças com uma inteligência especial.

Texto: Cláudia Pinto
Entrevista: Doutora Helena Serra, presidente da A.G. da APCS

Quando foi fundada a APCS e com que objectivos?
Esta associação foi criada em 1986 no Porto. O objectivo geral é assumir a defesa dos direitos e necessidades das crianças sobredotadas e das suas famílias.

Quantos associados tem a APCS?
É um número que oscila muito mas a média vai de 50 a 100 associados.

Como se define uma criança sobredotada?
É uma criança que reúne capacidades significativamente acima da média, em alguns domínios. Isto remete para um outro conceito que é o de inteligência e que tem sofrido uma evolução no tempo.

Uma das interpretações válidas é de Gardner que refere as inteligências múltiplas, considerando oito tipos de inteligências diferentes.

Uma criança destas pode revelar altíssimas capacidades em uma ou várias áreas, a que correspondem desempenhos de inteligência (linguística, lógico-matemática, espacial, quinestésico-corporal, musical, naturalista, interpessoal e intrapessoal).

Essa criança pode, no entanto, revelar um desempenho comum, ou mais baixo, por exemplo, no domínio psicomotor ou / e da socialização. A isto chama-se dissincronia (desnível interno).

Há alguma estatística que indique quantas crianças sobredotadas existem em Portugal?
Alguns estudos empíricos efectuados noutros países indicam que estas crianças se situam entre os 3 a 5%. Portanto, não existem estudos nacionais, mas estamos com empenho para os realizar através de uma amostra significativa.

Gostaria que me falasse de alguns mitos associados às crianças sobredotadas. Deve desmistificar-se o mito de que as crianças são génios?
Um dos mitos que persistem é pensar-se que, porque são consideradas crianças com capacidades acima da média, têm a vida facilitada, não precisam de professores nem de hábitos regulares. Este é um preconceito que deve ser destruído.

Estas crianças têm de ser correspondidas nessas competências e há sempre áreas que não acompanham este nível de eficiência fora do normal. Essas áreas devem ser trabalhadas e acompanhadas.

A família e a escola devem ter em atenção estes aspectos e incidir muito especialmente sobre a socialização. As crianças precisam de uma atenção especial, o que desfaz o mito.

Estes meninos têm de ser seguidos com atenção porque têm tanta curiosidade e motivação que, se não forem satisfeitos, passam a andar descontentes e desinteressados.

Como é que os pais se apercebem que estão perante uma criança sobredotada?
Há testes de identificação mas antes da preocupação de os aplicar formalmente, há muitos sinais. Por exemplo, ao nível linguístico, a criança pode ter desempenhos incomuns no domínio do vocabulário, da adjectivação e da estrutura da frase.

Há crianças que dão sinais muito cedo, ao nível da riqueza das frases. Outras crianças têm uma grande apetência pelos números, pelos símbolos (matrículas e marcas de automóveis, por exemplo), pelas letras, etc.

Há ainda outras crianças que descobrem mecanismos de leitura em idades absolutamente fora do comum. Há ainda quem revele competências no plano motor, no plano musical ou das expressões.

Esse modelo de inteligências múltiplas cria, de certo modo, um quadro de possibilidades de melhor compreensão destas crianças. Na prática, as crianças vão revelar-se num campo ou noutro.

Quando comparadas com crianças do seu grupo cultural e da mesma faixa etária, situam-se claramente acima da média.

Estas manifestações surgem a partir de que idade?
Estes sinais manifestam-se em crianças muito pequenas. Muitas vezes, os próprios pediatras apercebem-se que a postura, a atitude e a maneira de reagir da criança na consulta é diferente.

Há pais que são alertados pelos próprios pediatras para procurarem orientação para a educação dos filhos. Isto pode acontecer quando as crianças têm dois, três anos ou menos.

De que forma é que as capacidades das crianças sobredotadas podem ser estimuladas?
É aconselhável que o educador destas crianças tenha formação nesta matéria para haver um acompanhamento adequado. Por outro lado, estas crianças têm uma curiosidade muito invulgar. São criativas, altamente motivadas e uma inteligência major.

O professor e a escola devem tomar em conta estes aspectos para propor conteúdos e utilizar metodologias que as estimulem. Estas crianças devem ter estratégias diferenciadas para que se desenvolvam adequadamente.

Existe alguma legislação que possibilite a antecipação da entrada no 1.º ciclo às crianças que revelam ter capacidades acima da média?
O despacho n.º 50 / 2005, artigo 5º. A legislação prevê que a escola deve promover o desenvolvimento desta criança.

Deve promover a diferenciação pedagógica para que avance ao seu ritmo e para que seja estimulada nos domínios em que tem capacidades elevadas.

Nos outros domínios, deve ter actividades compensatórias que a enriqueçam.

É recomendável que as crianças sobredotadas sejam inseridas em turmas de bom nível mas no ensino regular.

As crianças sobredotadas desinteressam-se facilmente das actividades de outras crianças da mesma idade?
Não necessariamente. As brincadeiras dos meninos da sua idade podem ser demasiado infantis para acompanhar os seus gostos.

Há que fomentar certas actividades em grupo porque eles têm de se socializar pela afectividade e pelo jogo.

Não descansaremos enquanto não houver em cada agrupamento, uma dupla (pedagogia e psicologia) preparada para acompanhar os casos que vão surgindo.

Que tipo de ajuda é dado pela APCS aos pais de crianças sobredotadas?
Temos no Porto o programa “Sábados Diferentes” em parceria com a Escola Superior de Educação de Frassinetti. Esse programa já vai no 14º ano e tem sido frequentado por crianças que aqui têm actividades de enriquecimento.

Há programas equivalentes noutras cidades do país – Guarda e Póvoa de Varzim. Os pais também participam nestas actividades.

Porque é que existem crianças sobredotadas? Há alguma explicação científica ou ao nível dos genes que justifiquem essa situação?
É um fenómeno genotípico. O ambiente, ou é facilitador e lhe proporciona condições de desenvolvimento salutar ou, por outro lado, aquela capacidade maior pode não se desenvolver e o indivíduo pode transformar-se num fardo para a sociedade e passar a depender de medicamentos para andar equilibrado.

Não acompanhar de perto estes casos é um grande desinvestimento social e é um risco que se corre. Quando as escolas não olham a sério para este tema, no plano da educação, estão a desinvestir na sociedade e a criar marginalidade e/ou dependência medicamentosa.

Que atitudes se devem evitar? Ou seja, o que é que os pais não devem fazer? (por exemplo, proteger demasiado).
As crianças sobredotadas devem ter regras como as outras crianças. Devem ser alimentadas na sua curiosidade mas orientadas para algo que lhes interesse de facto e que valha a pena ser acompanhado.

Devem ter sempre em consideração actividades em grupo. As actividades de grupo têm a finalidade de colocar as crianças sobredotadas em relação sócio-afectiva com outras crianças. Serão espaços para ouvir e ser ouvido, o que fomenta o desenvolvimento pessoal e social.

Gostaríamos que estes cuidados estivessem a ser observados em todos os agrupamentos deste país. Os professores que trabalhem neste campo têm de ter formação especializada.

Pode dizer-se que estas crianças serão adultos mais bem sucedidos a nível profissional?
Não tenho dúvida, desde que a parte de envolvimento social seja bem estruturada na fase de crescimento. Conheço alguns casos que já passaram neste programa que estão muito bem estruturados na vida, muitos deles doutorados e com bons exemplos profissionais.

Estas crianças vivem todas as fases da vida um pouco mais cedo do que as outras?
Sim. Há mesmo um processo um pouco mais acelerado. A lei portuguesa permite que a criança só entre um ano mais cedo para a escolaridade e, em cada ciclo, possa avançar um ano.

Não temos casos em Portugal como nos EUA em que crianças com doze anos entram para a faculdade. Temos de analisar os contextos culturais em que as crianças se inserem.


Contactos da APCS
Rua Gil Vicente, 138-140
4000-255 Porto
Telf. 225 573 420/5
Fax. 225 508 485
Site. www.apcs.co.pt

O que devem os pais fazer e evitar?

PAIS
devem

PAIS
não devem

Responder e fazer perguntas com paciência e bom humor

Tratar uma criança sobredotada como um adulto só porque possui capacidades extraordinárias

Procurar informação para responder a perguntas que desconheçam

Ignorá-la ou culpabilizá-la por questionar e querer aprender tudo (embora, por vezes, se torne cansativo)

Conversar com o filho, discutir acontecimentos e situações pelas quais ele se interesse

Enganá-la pois o seu juízo moral perceberá facilmente que lhe estão a mentir e é muito difícil recuperar a sua confiança

Elogiar e encorajar os seus pontos fortes

Deixar a criança desrespeitar regras, não acolher rotinas

Ajudar a aceitar e a reconhecer as suas limitações

Exigir dela mais do que pode dar

Proporcionar um melhor desenvolvimento das suas capacidades (maximizando as áreas fortes e estimulando as mais fracas)

Exibir a criança e os seus dotes

Dar-lhe espaço para o seu trabalho e passatempos

Manter-se demasiado ocupados, de forma a estar pouco disponíveis para o filho

Alertar a escola para a situação; colaborar com ela, fornecendo “dicas” para o Plano de Desenvolvimento

Preencher demasiado o tempo da criança com actividades, de modo a que a criança fique sobre-ocupada

Reunir informação sobre respostas existentes (legislação, programas de enriquecimento, etc.)

Ficar demasiado ansiosos face às exigências próprias desta realidade

Esclarecer-se sobre o tema fazendo formação

Criar expectativas exageradas, nem subvalorizar a situação

O que devem os professores fazer e evitar?

Professores
devem

Professores
não devem

Estar atentos e observar a criança nos diferentes domínios e momentos da sua vida diária

Propor tarefas rotineiras e/ou não desafiantes

Confrontar as suas observações com informações fornecidas pelos pais

Ignorá-la ou culpabilizá-la por questionar e querer aprender tudo

Recorrer a técnicos especializados na área em que a criança mostra mais aptidões para desenvolver melhor as suas capacidades (maiores e menores)

Sentir-se ”ameaçados” pelo seu nível de conhecimentos e tipo de questionamentos

Fazer formação para adequar as metodologias às necessidades do aluno

Tirar conclusões unicamente a partir de um determinado tipo de dados

Promover constantemente a sua integração social

Utilizar metodologias pouco diversificadas

Manter o contacto frequente com os pais do aluno

Criar expectativas exageradas, nem subvalorizar a situação

Praticar a diferenciação positiva

Exibir a criança e os seus dotes

Promover um clima de confiança entre professor e aluno

Ignorá-la ou culpabilizá-la por questionar e querer aprender tudo mais rapidamente (embora, por vezes, se torne cansativo)

Suscitar a curiosidade do aluno e estimular a criatividade e fantasia

Impedir que, nas aulas, o aluno coloque questões pertinentes e exponha o seu ponto de vista

DESTAQUES

Quando comparadas com crianças do seu grupo cultural e da mesma faixa etária, situam-se claramente acima da média

Há pais que são alertados pelos próprios pediatras para procurarem orientação para a educação dos filhos

Não acompanhar de perto estes casos é um grande desinvestimento social e é um risco que se corre

Os pais não devem exibir as crianças e as suas capacidades

É fundamental que os pais proporcionem um melhor desenvolvimento das suas capacidades (maximizando as áreas fortes e estimulando as mais fracas)

Sapo Familia-Guia dos pais


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