quinta-feira, 19 de maio de 2011

Mutismo Seltivo-parte 2

Todos nós compartilhamos os medos, tristeza, frustração, obstáculos e alegrias criados pelo Mutismo Seletivo. Todos nós aprendemos dele e sobre ele, que nos leva por novos caminhos e viagens. Sentimo-nos compelidos a falar a nossos filhos, a ir mais além de ser simplesmente pais “normais”, para nos transformar em “especiais”, mais sábios, mais observadores, mais empáticos, mais sensíveis também. É impossível que sigamos sendo os mesmos, imutáveis, enquanto tenhamos um filho com Mutismo Seletivo.

Esta não é a primeira vez que falo como o Mutismo Seletivo – e de formas diferentes de muitos outros obstáculos na vida ou circunstâncias relacionadas à saúde mental – se apresenta como um instrumento e desculpa utilizada pela vida para nos pressionar de diversos modos, muito mais que aqueles que não enfrentam uma situação como esta. Na verdade, poderia e deveria se transformar em uma bênção, uma fonte profunda de crescimento e sapiência, fortaleza e esperança.

Cada ser humano é único, como cada família e sociedade o são, como qualquer outro sistema; não existe sequer um ser exatamente igual ao outro, e é isso o que faz nossa experiência tão rica. No entanto, existem emoções universais, valores, necessidades e experiências que todos nós compartilhamos de uma forma ou outra, e é isso o que nos ajuda a que nos entendamos uns aos outros, que nos capacita a contemplar diferentes pontos de vista e compartilhar em grupos sociais, criando culturas, criando significado e plenitude também.

Não há dúvida que dependendo de quão hábil e harmoniosa seja uma família, as crianças com Mutismo Seletivo experimentarão um caminho mais ou menos difícil nos processos de autodescobrimento e expressão de si mesmos. É a qualidade e consistência do apoio que uma pessoa com Mutismo Seletivo recebe, o que poderia fazer a diferença entre o promover a cura ou a desesperança, fortaleza ou maior ansiedade, fortalecimento ou exclusão.

Se você, como pai, vê a que a ajuda “profissional” não está sendo eficaz de uma forma ou outra, então faça algo a respeito. Converse, dialogue, explore enfoques alternativos para que aqueles profissionais possam apoiar melhor a sua filha, a você como pai, a sua família, e àqueles que estão conectados a ela de maneira mais próxima, como professores e pessoal da escola. Não seja passivo e sim, tome ações imediatas e consistentes, apontando mudanças e melhoras reais. Seja paciente, é essencial, mas não passivo. Se se faz necessário que uma criança vá a outra escola onde possa recomeçar sua vida escolar e social, então acolha tal opção e siga em frente. Se a administração e pessoal docente do colégio atual não estão dispostos e não são capazes de oferecer o respeito, empatia, compreensão e apoio necessários, e você tentou da melhor forma possível para motivar as mudanças e não encontrou mais que resistência e rejeição à ajuda, então siga adiante e procure um melhor lugar para sua filha.

Quando não há outro lugar, uma melhor escola, então é necessário enfocar todos os esforços em iniciar e apoiar mudanças nessa escola. Sua filha necessita sua ajuda, e cada dia de trabalho neste apoio valerá a pena. No entanto lembre-se, se depois de haver trabalhado tanto, vê que o desfavorável supera o positivo que haja sido conseguido, amplie suas opções e considere soluções alternativas. Se tiver que se mudar para que assim sua filha possa ir a uma melhor escola, então mude-se. Não seja impulsivo. Não se trata de fazer coisas de forma aloucada sem o planejamento suficiente, avaliando todas as consequências e obstáculos que terá que enfrentar. Tenha os pés no chão, seja objetivo, estabeleça suas prioridades e escolha a partir daí.

Decidimos – há pouco mais de um ano – que nossa filha iria a uma Escola Católica grande, já que chegamos muito tarde do exterior e já não haviam vagas em outras escolas locais, além do que acreditamos que o prestígio de tal colégio asseguraria uma boa educação e apoio para nossa pequena. A experiência provou que estávamos errados ao chegar a tal conclusão. De qualquer forma, não tivemos alternativas naquele momento.

Aqueles que nos vêm acompanhando através deste site, sabem que não foi fácil em absoluto. Lutamos e ficamos muito tristes e frustrados. Entretanto, este não foi o final da história.

Lembram como em um artigo anterior compartilhamos quão esperançados e entusiasmados nos sentíamos pelos planos de Carmencita, cheios de vontade e esforço para começar este novo ano escolar em uma nova e pequena escola, onde ela falaria aos professores e estudantes? E como ansiávamos por que tal plano se tornasse realidade? Pois bem, aconteceu! Levou tempo, mas finalmente conseguimos e começamos a ver como uma realidade concreta, uma que estamos certos continuará melhorando com o tempo.

Há poucos dias recebemos outra mensagem nos felicitando pelos progressos de Carmencita e compartihando como a filha desta pessoa também começou a falar na escola, sentindo-se literalmente plena pela alegria que uma melhora tão dramática traz a todo pai cuidadoso.

Novamente, não tenham medo de provar coisas novas, a mudar algo depois de ter trabalhado tanto e descobrir que não vale a pena continuar tentando. Muitas vezes os pais não podem ter um “segundo trabalho” a meio tempo tratando de educar e vigiar o cumprimento de toda uma escola, buscando a que os professores sejam ao menos respeitosos e agradáveis, quando não são empáticos, nem sábios com relação aos estudantes com Mutismo Seletivo. Enfatizamos, uma vez mais, que muitas instituições que oferecem uma educação mais personalizada, com enfoques menos rígidos e dogmáticos, sem egos institucionais excessivos e expectativas distorcionadas, transformam-se nos melhores lugares para uma criança com Mutismo Seletivo. Com certeza, um professor gentil e competente pode fazer a diferença, mas necessitará o apoio de seu sistema escolar para que os esforços sejam viáveis e frutíferos. Sabemos, como pais, como uma pessoa má em uma escola ou um estudante abusador podem facilmente detonar e alimentar muita ansiedade em nossos filhos, a tal ponto que não desejamos arriscar a exposição a tais situações. Ou sim?

Obrigado por percorrer este caminho conosco.


Como são as Terapias Adequadas para o Mutismo Seletivo?

“Minha filha de 4 anos acaba de ser diagnosticada com M.S., há pouco começou com as terapias, mas gostaria de saber como são as adequadas para este tipo de desordem”.

Com relação a sua consulta é esperançoso saber que assim que diagnosticaram o M.S. em sua filhinha começaram com a ajuda profissional imediatamente, já que isso é o ideal. Quanto mais cedo a intervenção profissional juntamente à educação de pais, família e pessoal educativo relacionado à criança, melhor para poder conseguir resultados positivos e evitar maiores complicações.

Em artigos prévios falamos de como a criança vai aprendendo e se acostumando a não falar, e também a reforçar as condutas e pensamentos em resposta à ansiedade no que chamamos de M.S. Podemos dizer que estas condutas-pensamentos-emoções se transformam em mecanismos de defesa para evitar a ansiedade, mecanismos que com o passar dos dias, semanas, meses e anos se tornam predominantes, muito fortes, difíceis de vencer e passam a formar parte da identidade que a criança desenvolve de si mesma, como também da imagem que projeta e da forma como os demais, começando pelos pais e familiares, o vêem. Isso, muitas vezes, não faz senão alimentar um círculo vicioso do qual é cada vez mais difícil sair, para a criança e aquelas pessoas ligadas a ela.

As “terapias” variam segundo o enfoque terapêutico do profissional e as próprias técnicas que este implemente. Em termos gerais podemos dizer que dentro daquelas que devem ser incluídas, segundo o que até o dia de hoje sabemos que funciona para ajudar a pessoas com M.S., encontramos a terapia cognitiva-condutual, a qual se enfoca em modificar ou melhorar o pensamento, crenças e idealismos da pessoa com relação a si mesma, a sua ansiedade e a como enfrentá-la e controlá-la. Embora seja certo que a ansiedade não respeita nem obedece totalmente ao intelecto, é possível reeducar a pessoa a modificar suas crenças e o padrão de pensamento que leva e alimenta a ansiedade. Na medida em que novas crenças e pensamentos são introduzidos na mente da pessoa, estes vão sendo reforçados e assim, assimilados emocionamente também, o qual possibilita uma mudança e melhoria em condutas e reações-respostas, incluindo aquelas necessárias frente à ansiedade.

Não há como descrever em poucas linhas, a detalhe, todos os enfoques psicológicos que podem ser utilizados para apoiar à pessoa com M.S., no entanto, podemos dizer que junto à terapia cognitivo-condutual existem aquelas “centralizadas no cliente ou na pessoa”, a qual provêm das escolas humanistas da psicologia, as que contemplam ao ser humano como um ser único, sensível, realmente humano, pelo que as terapias são sumamente conscientes e sensíveis a respeitar, apoiar e promover a individualidade de cada um, desde sua exploração e compreensão, até seu tratamento. Quantas vezes reclamamos, por exemplo, da frialdade, rapidez e mecanicismo que um profissional da saúde nos “vê” ou “atende”? Lhes é familiar a sensação de ser tratado como um a mais na lista de espera ou como um “paciente” ao que se diz o que se tem que fazer sem escutá-lo, conhecê-lo, nem empatizar com ele realmente? Pois quando se trata da saúde mental, e mais ainda de uma condição como o M.S., o profissional deve ser e possuir estas qualidades humanas, e de competência humanista de boa empatia, sensibilidade, cuidado real e preocupação pela pessoa, de aprender de sua vivência e situação em lugar de implantar um método geral descartando todas as necessidades e expectativas peculiares deste cliente-pessoa em particular.

Para adultos, a psicoterapia da “fala” pode ser muito útil, mas para crianças resulta muitas vezes, limitada, se não é ajustada completamente à idade, desenvolvimento e individualidade da criança, é por isso que ao se tratar de crianças a terapia do jogo é fundamental, como seu dinamismo quando se usam outros enfoques e técnicas, sejam congnitivas, condutuais ou humanistas. Sendo assim, você veria ao terapeuta literalmente brincando com sua criança, usando o jogo como meio de exploração, de comunicação, de partilha, para assim criar uma “aliança terapêutica” adequada, essa confiança e o sentir-se cômodo e seguro a tal ponto de poder abrir-se, estar presente e compartilhar o que passa dentro de si. Neste caso, através do jogo, da atividade lúdica. Existem assim a terapia da caixa de areia, jogo com bonecos ou marionetes, jogos de mesa e aqueles que são os chamados “jogos terapêuticos”, que são exclusivamente desenhados para a psicoterapia com crianças, púberes e adolescentes.

Não quero deixar passar o importante e ideal do ensinamento e o treinamento da criança-cliente em habilidades de relaxamento e controle de ansiedade. Isso se consegue com o adestramento em técnicas de relaxamento, meditação, atenção e similares, adequadas apropriadamente à idade do cliente e a suas preferências e aptidões pessoais.

O terapeuta irá estimulando a confiança e estima do cliente, incluindo imagem pessoal, até habilidades de expressão e comunicação verbal e não verbal; reforçando todo o avanço gradual, emboura pausado, trabalhando colateralmente com pais e educadores para continuar tais ações terapêuticas, consolidá-las e inclusive para implementar técnicas em casa, escola e outros ambientes sociais onde a criança requeira apoio e estimulação diretas.

Nas sessões de terapia, muitas vezes se começará trabalhando com a presença da mãe ou do pai, ou de qualquer outro familar que goze da confiança da criança para mediar a comunicação e criar o ambiente confortável. Podemos dizer que o terapeuta joga, inicialmente, um papel de espectador na dinâmica criada entre o familiar e o cliente-criança, para logo se tornar mais ativo, uma vez ganhe a confiança do cliente.

Pouco a pouco se deverá incluir a outras pessoas, gradualmente, que representem ou criem ansiedade na criança. Idealmente falamos da professora, pessoa com a que a criança interaja de forma silenciosa em maior ou menor medida. As terapias assim também deverão levar-se a cabo não exclusivamente no consultório, mas também na casa da criança, escola onde estude ou creche. Estes são lugares que representam um maior ou menor nível de comodidade, segurança e confiança-ansiedade para a criança, portanto seu uso flexível e pertinente por parte do terapeuta e dos demais profissionais e pessoas envolvidas na terapia deverá ser tomado em conta.

Nos próximos artigos desenvolveremos um pouco mais do tema, que sem dúvida é de sumo interesse e necessidade de todos os envolvidos com o M.S. Quero terminar recordando uma vez mais a importância que tem a própria relação no emocional e vivencial da criança-pessoa com o M.S. com aqueles que o rodeiam, começando por pais, educadores e profissionais da saúde mental e verão como o monstro da ansiedade, medo e incerteza desaparecerão.


Instituto de Mutismo Seletivo

Mutismo Seltivo- parte 1

Mutismo Seletivo
DSM.IV - MUTISMO SELETIVO - DSM.IV
(anteriormente Mutismo Eletivo)

Características Diagnósticas

A característica essencial do Mutismo Seletivo é o fracasso persistente em falar em situações sociais específicas (por ex., escola, com colegas de brincadeiras) onde seria esperado que falasse, apesar de falar em outras situações (Critério A).

A perturbação interfere na realização escolar ou ocupacional ou na comunicação social (Critério B), devendo durar no mínimo 1 mês e não estar limitada ao primeiro mês de escolarização (durante o qual muitas crianças podem mostrar-se tímidas e relutantes em falar) (Critério C).

O Mutismo Seletivo não deve ser diagnosticado se o fracasso do indivíduo em falar se deve unicamente a uma falta de conhecimento ou de conforto com a linguagem necessária na situação social (Critério D).

Ele também não é diagnosticado se a perturbação é melhor explicada por embaraço relacionado a ter um Transtorno da Comunicação (por ex., Tartamudez) ou se ocorre exclusivamente durante um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico (Critério E). Ao invés de se comunicarem pela verbalização costumeira, as crianças com este transtorno podem comunicar-se por gestos, acenando ou balançando a cabeça, puxando ou empurrando ou, em alguns casos, por vocalizações monossilábicas, curtas ou monótonas, ou em um tom de voz alterado.

Características e Transtornos Associados
As características associadas ao Mutismo Seletivo podem incluir excessiva timidez, medo do embaraço social, isolamento e retraimento social, dependência, traços compulsivos, negativismo, acessos de raiva ou comportamento controlador ou opositivo.

Provocações ou agressões pelos seus pares são comuns. Embora as crianças com o transtorno em geral tenham habilidades normais de linguagem, ocasionalmente pode haver um Transtorno da Comunicação (por ex., Transtorno Fonológico, Transtorno da Linguagem Expressiva ou Transtorno Misto da Linguagem Receptivo-Expressiva) ou uma condição médica geral que cause anormalidades da articulação.

Transtornos de Ansiedade (especialmente Fobia Social), Retardo Mental, hospitalização ou estressores psicossociais extremos podem estar associados com o transtorno.

Características Específicas à Cultura e ao Gênero
Crianças imigrantes não familiarizadas ou desconfortáveis com a língua oficial de seu novo país podem recusar-se a falar com estranhos em seu novo ambiente. Este comportamento não deve ser diagnosticado como Mutismo Seletivo. O Mutismo Seletivo é ligeiramente mais comum no sexo feminino.

Prevalência
O Mutismo Seletivo é aparentemente raro, sendo encontrado em menos de 1% dos indivíduos vistos em contextos de saúde mental.

Curso
O início do Mutismo Seletivo geralmente se dá antes dos 5 anos de idade, mas a perturbação pode não chegar à atenção clínica até o ingresso da criança na escola. Embora a perturbação em geral dure apenas alguns meses, às vezes ela pode persistir até por vários anos.

Diagnóstico Diferencial
O Mutismo Seletivo deve ser diferenciado das perturbações da fala, melhor explicadas por um Transtorno da Comunicação, como Transtorno Fonológico, Transtorno da Linguagem Expressiva ou Transtorno Misto da Linguagem Receptivo-Expressiva ou Tartamudez.

Diferentemente do Mutismo Seletivo, a perturbação da fala nestes transtornos não se restringe a uma situação social específica. As crianças de famílias que imigraram para um país onde uma língua diferente é falada podem recusar-se a falar em virtude da falta de conhecimentos do novo idioma. Se a compreensão da nova língua é adequada, mas a recusa em falar persiste, um diagnóstico de Mutismo Seletivo pode ser indicado.

Os indivíduos com Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Esquizofrenia, outro Transtorno Psicótico ou Retardo Mental severo podem ter problemas na comunicação social e ser incapazes de falar apropriadamente em situações sociais.

Em comparação, o Mutismo Seletivo deve ser diagnosticado apenas em uma criança cuja capacidade de falar foi estabelecida em algumas situações sociais (por ex., tipicamente em casa). A ansiedade e a esquiva social na Fobia Social podem estar associadas com o Mutismo Seletivo. Nesses casos, ambos os diagnósticos podem ser dados.

Critérios Diagnósticos para F94.0 - 313.23 Mutismo Seletivo
A. Fracasso persistente em falar em situações sociais específicas (nas quais existe a expectativa para falar, por ex., na escola), apesar de falar em outras situações.
B. A perturbação interfere na realização educacional ou ocupacional ou na comunicação social.
C. A duração da perturbação é de no mínimo 1 mês (não limitada ao primeiro mês de escolarização).
D. O fracasso em falar não se deve a uma falta de conhecimento ou desconforto com a linguagem falada exigida pela situação social.
E. A perturbação não é melhor explicada por um Transtorno da Comunicação (por ex., Tartamudez), nem ocorre exclusivamente durante o curso de um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico.
http://virtualpsy.locaweb.com.br

Os fundamentos das deficiências e síndromes


Conhecer o que afeta o seu aluno é o primeiro passo para criar estratégias que garantam a aprendizagem


Inclusão, deficiências, educação especial


O primeiro passo é entender as diferenças entre os dois termos. Deficiência é um desenvolvimento insuficiente, em termos globais ou específicos, ou um déficit intelectual, físico, visual, auditivo ou múltiplo (quando atinge duas ou mais dessas áreas). Síndrome é o nome que se dá a uma série de sinais e sintomas que, juntos, evidenciam uma condição particular. A síndrome de Down, por exemplo, engloba deficiência intelectual, baixo tônus muscular (hipotonia) e dificuldades na comunicação, além de outras características, que variam entre os atingidos por ela. Você sabe o que é síndrome de Rett, síndrome de Williams ou surdo-cegueira? Para receber os alunos com necessidades educacionais especiais pela porta da frente, é preciso conhecer as características de cada síndrome ou deficiência.


Se você leciona para alguém com diagnóstico que se encaixa nesse quadro, precisa saber que é possível ensiná-lo. "O professor deve se comprometer e acompanhar seu desenvolvimento", afirma Mônica Leone Garcia, assessora técnica da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.

Conheça a seguir as definições e características das síndromes e deficiências mais frequentes na escola.

Deficiência física

- Definição: uma variedade de condições que afeta a mobilidade e a coordenação motora geral de membros ou da fala. Pode ser causada por lesões neurológicas, neuromusculares e ortopédicas, más-formações congênitas ou por condições adquiridas. Exemplos: amiotrofia espinhal (doença que causa fraqueza muscular), hidrocefalia (excesso do líquido que serve de proteção ao sistema nervoso central) e paralisia cerebral (desordem no sistema nervoso central), que exige dos professores cuidados específicos em sala de aula (leia mais a seguir).
Características: são comuns as dificuldades no grafismo em função do comprometimento motor. Às vezes, o aprendizado é mais lento, mas, exceto nos casos de alteração na motricidade oral, a linguagem é adquirida sem problemas. Muitos precisam de cadeira de rodas ou muletas para se locomover. Outros apenas de apoios especiais e material escolar adaptado, como apontadores, suportes para lápis etc.
Recomendações: a escola precisa ter elevadores ou rampas. Fique atento a cuidados do dia a dia, como a hora de ir ao banheiro. “Algum funcionário que tenha força deve acompanhar a criança”, explica Marília Costa Dias, professora do Instituto Superior de
Educação Vera Cruz, na capital paulista. Nos casos de hidrocefalia, é preciso observar sintomas como vômitos e dores de cabeça, que podem indicar problemas com a válvula implantada na cabeça.

PARALISIA CEREBRAL
Definição: lesão no sistema nervoso central causada, na maioria das vezes, por uma falta de oxigênio no cérebro do bebê durante a gestação, ao nascer ou até dois anos após o parto. "Em 75% dos casos, a paralisia vem acompanhada de um dano intelectual”, acrescenta Alice Rosa Ramos, superintendente técnica da Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em São Paulo.
Características: a principal é a espasticidade, um desequilíbrio na contenção muscular que causa tensão. Inclui dificuldades para caminhar, na coordenação motora, na força e no equilíbrio. Pode afetar a fala.
Recomendações: para contornar as restrições de coordenação motora, use canetas e lápis mais grossos – uma espuma em volta deles presa com um elástico costuma resolver. Utilize folhas avulsas, mais fáceis de manusear que os cadernos. Escreva com letras grandes e peça que o aluno se sente na frente. É importante que a carteira seja inclinada. Se ele não consegue falar e não utiliza uma prancha própria de comunicação alternativa, providencie uma para ele com desenhos ou fotos por meio dos quais se estabelece a comunicação. Ela pode ser feita com papel cartão ou cartolina, em que são colados figuras pequenas, do mesmo material, e fotos que representem pessoas e coisas significativas, como os pais, os colegas da classe, o time de futebol, o abecedário e palavras-chave, como “sim”, “não”, “fome”, “sede”, “entrar”, “sair” etc. Para informar o que quer ou sente, o aluno aponta para as figuras e se comunica. Ele precisa de um cuidador para ir ao banheiro e, em alguns casos, para tomar lanche.

Deficiência Visual

Definição: condição apresentada por quem tem baixa visão (em geral, entre 40 e 60%) ou cegueira (resíduo mínimo da visão ou perda total), que leva à necessidade de usar o braile para ler e escrever.
Características: a perda visual é causada em geral por duas doenças congênitas: glaucoma (pressão intraocular que causa lesões irreversíveis no nervo ótico) e catarata (opacidade no cristalino). Em alguns casos, as doenças são confundidas com uma ametropia (miopia, hipermetropia ou astigmatismo), que pode ser corrigida pelo uso de lentes, o que permite o retorno total da visão. A catarata também pode ser corrigida, mas só com cirurgia. “O aluno que não enxerga o colega a 2 metros nas brincadeiras, principalmente em espaços abertos, pode ter 5 ou 6 graus de miopia e não necessariamente baixa visão ou cegueira”, explica o oftalmologista Frederico Lazar, de São Paulo.
Recomendações: promover a realização de exames de acuidade visual na escola para identificar possíveis doenças – reversíveis ou não – ou ametropias. Se o estudante não percebe expressões faciais, lide com ele de maneira perceptiva, alterando, por exemplo, o tom de voz. As atenções devem ser redobradas quando o assunto é orientação e mobilidade. É preciso identificar os degraus com contraste (faixa amarela ou barbante), os obstáculos, como pisos com alturas diferentes, e, principalmente, os vãos livres e desníveis. A sinalização de marcos importantes, como tabuletas indicando cada sala e espaço, é feita também em braile. Uma ideia é trabalhar maquetes da escola para que o espaço seja facilmente identificado.

Na sala de aula, é aconselhável não colocar mochilas no chão ou no corredor entre as carteiras. Use materiais maiores e reconhecíveis pelo tato. Aproxime os que têm baixa visão do quadro-negro, já que alguns conseguem enxergar quando sentados na primeira carteira. Outros precisam de equipamentos especiais. Para os que não conseguem ler o que está escrito no quadro, há algumas possibilidades. “Traga o material já escrito de casa e entregue a eles ou peça que os colegas, em sistema de revezamento, os auxiliem na tarefa”, explica a psicóloga Cecília Batista, do Departamento de Desenvolvimento Humano e Reabilitação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Deficiência Auditiva

Definição: condição causada por má-formação na orelha, no conduto (cavidade que leva ao tímpano), nos ossos do ouvido ou ainda por uma lesão neurossensorial no nervo auditivo ou na cóclea (porção do ouvido responsável pelas terminações nervosas). Tem origem genética ou pode ser provocada por doenças infecciosas, como a rubéola e a meningite. Também pode ser temporária, causada por otite.
Características: pode ser leve, moderada, severa ou profunda. “Quanto mais aguda, mais difícil é o desenvolvimento da linguagem”, diz a fonoaudióloga Beatriz Mendes, docente da Pontifícia Universidade Católica (PUC), em São Paulo, que atua na Divisão de Educação e Reabilitação dos Distúrbios da Comunicação (Derdic). Um exame fonoaudiológico é capaz de identificar o grau da lesão.
Recomendações: há duas formas de o aluno com deficiência auditiva desenvolver a linguagem. Uma delas é usar um aparelho auditivo e passar por acompanhamento terapêutico, familiar e escolar. “Pessoas surdas conseguem falar”, ressalta Beatriz Mendes.
Para isso, tem de passar por terapia, receber novos moldes e próteses e ter o apoio da família e do professor”, complementa Beatriz Novaes, docente da PUC e coordenadora do Centro Audição na Criança da Derdic, da mesma universidade paulistana. Outro meio é aprender a língua brasileira de sinais (Libras). O estudante que tem perda auditiva também demora mais para se alfabetizar. Pedir que se sente nas carteiras da frente pode ajudá-lo a aprender melhor. “Fale perto e de frente para ele”, destaca Beatriz Mendes. Aposte também no uso de recursos visuais e na diminuição de ruídos – e tente o apoio e a integração por meio de um intérprete de Libras.

Deficiência múltipla


Definição: ocorrência de duas ou mais deficiências: autismo e síndrome de Down; uma intelectual com outra física; uma intelectual e uma visual ou auditiva, por exemplo. “Não há estudos que indiquem qual associação de deficiência é a mais comum”, afirma Shirley Rodrigues Maia, diretora de programas educacionais da Associação Educacional para Múltipla Deficiência (Ahimsa). Uma das mais comuns nas salas de aula é a surdo-cegueira.

SURDO-CEGUEIRA
Definição: perdas auditivas e visuais simultâneas e em graus variados. As causas são principalmente doenças infecciosas, como rubéola, toxoplasmose e citomegalovírus (doença da mesma família do herpes). A diferença de um cego ou surdo para um surdo-cego é que este não tem consciência da linguagem e, portanto, não aprende a se comunicar de imediato.
Características: traz problemas de comunicação e mobilidade. O surdo-cego pode apresentar dois comportamentos distintos: isola-se ou é hiperativo.
Recomendações: o primeiro desafio é criar formas de comunicação. Busque também integrar esse estudante aos demais e criar rotinas previsíveis para que ele possa entender o que vai acontecer. Ofereça objetos multissensoriais, que facilitam a comunicação
.

Deficiência intelectual

Definição: funcionamento intelectual inferior à média (QI), que se manifesta antes dos 18 anos. Está associada a limitações adaptativas em pelo menos duas áreas de habilidades (comunicação, autocuidado, vida no lar, adaptação social, saúde e segurança, uso de recursos da comunidade, determinação, funções acadêmicas, lazer e trabalho). O diagnóstico do que acarreta a deficiência intelectual é muito difícil, englobando fatores genéticos e ambientais. Além disso, as causas são inúmeras e complexas, envolvendo fatores pré, peri e pós-natais. Entre elas, a mais comum na escola é a síndrome de Down.

SÍNDROME DE DOWN
Definição: alteração genética caracterizada pela presença de um terceiro cromossomo de número 21. A causa da alteração ainda é desconhecida, mas existe um fator de risco já identificado. “Ele aumenta para mulheres que engravidam com mais de 35 anos”, afirma Lília Maria Moreira, professora de Genética da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Características: além do déficit cognitivo, são sintomas as dificuldades de comunicação e a hipotonia (redução do tônus muscular). Quem tem a síndrome de Down também pode sofrer com problemas na coluna, na tireoide, nos olhos e no aparelho digestivo, entre outros, e, muitas vezes, nasce com anomalias cardíacas, solucionáveis com cirurgias.
Recomendações: na sala de aula, repita as orientações para que o estudante com síndrome de Down compreenda. “Ele demora um pouco mais para entender”, afirma Mônica Leone Garcia, da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo. O desempenho melhora quando as instruções são visuais. Por isso, é importante reforçar comandos, solicitações e tarefas com modelos que ele possa ver, de preferência com ilustrações grandes e chamativas, com cores e símbolos fáceis de compreender. A linguagem verbal, por sua vez, deve ser simples. Uma dificuldade de quem tem a síndrome, em geral, é cumprir regras. “Muitas famílias não repreendem o filho quando ele faz algo errado, como morder e pegar objetos que não lhe pertencem”, diz Mônica. Não faça isso. O ideal é adotar o mesmo tratamento dispensado aos demais. “Eles têm de cumprir regras e fazer o que os outros fazem. Se não conseguem ficar o tempo todo em sala, estabeleça combinados, mas não seja permissivo.” Tente perceber as competências pedagógicas em cada momento e manter as atividades no nível das capacidades da criança, com desafios gradativos. Isso aumenta o sucesso na realização dos trabalhos. Planeje pausas entre as atividades. O esforço para desenvolver atividades que envolvam funções cognitivas é muito grande e, às vezes, o cansaço faz com que pareçam missões impossíveis para ela. Valorize sempre o empenho e a produção. Quando se sente isolada do grupo e com pouca importância no trabalho e na rotina escolares, a criança adota atitudes reativas, como desinteresse, descumprimento de regras e provocações.

TGD

Definição: os Transtornos Globais do Desenvolvimento (TGD) são distúrbios nas interações sociais recíprocas, com padrões de comunicação estereotipados e repetitivos e estreitamento nos interesses e nas atividades. Geralmente se manifestam nos primeiros cinco anos de vida.

AUTISMO
Definição: transtorno com influência genética causado por defeitos em partes do cérebro, como o corpo caloso (que faz a comunicação entre os dois hemisférios), a amídala (que tem funções ligadas ao comportamento social e emocional) e o cerebelo (parte mais anterior dos hemisférios cerebrais, os lobos frontais).
Características: dificuldades de interação social, de comportamento (movimentos estereotipados, como rodar uma caneta ou enfileirar carrinhos) e de comunicação (atraso na fala). “Pelo menos 50% dos autistas apresentam graus variáveis de deficiência intelectual”, afirma o neurologista José Salomão Schwartzman, docente da pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo. Alguns, porém, têm habilidades especiais e se tornam gênios da informática, por exemplo.
Recomendações: para minimizar a dificuldade de relacionamento, crie situações que possibilitem a interação. Tenha paciência, pois a agressividade pode se manifestar. Avise quando a rotina mudar, pois alterações no dia a dia não são bem-vindas. Dê instruções claras e evite enunciados longos.

SÍNDROME DE ASPERGER
Definição: condição genética que tem muitas semelhanças com o autismo.
Características: focos restritos de interesse são comuns. Quando gosta de Matemática, por exemplo, o aluno só fala disso. “Use o assunto que o encanta para introduzir um novo”, diz Salomão Schwartzman.
Recomendações: as mesmas do autismo.

SÍNDROME DE WILLIAMS
Definição: desordem no cromossomo 7.
Características: dificuldades motoras (demora para andar e falta de habilidade para cortar papel e andar de bicicleta, entre outros) e de orientação espacial. Quando desenha uma casa, por exemplo, a criança costuma fazer partes dela separadas: a janela, a porta e o telhado ficam um ao lado do outro. No entanto, há um interesse grande por música e muita facilidade de comunicação. “As que apresentam essa síndrome têm uma amabilidade desinteressada”, diz Mônica Leone Garcia.
Recomendações: na sala de aula, desenvolva atividades com música para chamar a atenção delas.

SÍNDROME DE RETT
Definição: doença genética que, na maioria dos casos, atinge meninas.
Características: regressão no desenvolvimento (perda de habilidades anteriormente adquiridas), movimentos estereotipados e perda do uso das mãos, que surgem entre os 6 e os 18 meses. Há a interrupção no contato social. A comunicação se faz pelo olhar.
Recomendações: “Crie estratégias para que esse aluno possa aprender, tentando estabelecer sistemas de comunicação”, diz Shirley Rodrigues Maia, da Ahim-sa. Muitas vezes, crianças com essa síndrome necessitam de equipamentos especiais para se comunicar melhor e caminhar.

Revista Escola

O que é paralisia cerebral?

A paralisia cerebral é uma lesão cerebral que acontece, em geral, quando falta oxigênio no cérebro do bebê durante a gestação, no parto ou até dois anos após o nascimento - neste caso, pode ser provocada por traumatismos, envenenamentos ou doenças graves, como sarampo ou meningite.

Dependendo do local do cérebro onde ocorre a lesão e do número de células atingidas, a paralisia danifica o funcionamento de diferentes partes do corpo. A principal característica é a espasticidade, um desequilíbrio na contenção muscular que causa tensão e inclui dificuldades de força e equilíbrio. Em outras palavras, a lesão provoca alterações no tônus muscular e o comprometimento da coordenação motora. Em alguns casos, há também problemas na fala, na visão e na audição.

Ter uma lesão cerebral não significa, necessariamente, ser acometido de danos intelectuais, mas em 75% dos casos as crianças com paralisia cerebral acabam sofrendo comprometimentos cognitivos.

Como lidar com a paralisia cerebral na escola?
Para dar conta das restrições motoras da criança com paralisia cerebral, vale adaptar os espaços da escola para permitir o acesso de uma cadeira de rodas, por exemplo. Na sala de aula use canetas e lápis mais grossos, envoltos em espuma e presos com elástico para facilitar o controle do aluno. Os papeis são fixados em pranchetas para dar firmeza e as folhas avulsas, nesse caso, são mais recomendáveis que os cadernos. O professor deve escrever com letras grandes e pedir para que o aluno com paralisia cerebral sente-se na frente, se possível, com uma carteira inclinada, que dá mobilidade e facilita a escrita.

Se o aluno apresentar problemas na fala e na audição, providencie uma prancha de comunicação, para que ele se expresse pela escrita. Caso isso não seja possível, o professor pode preparar cartões com desenhos ou fotos de pessoas e objetos significativos para o aluno, como os pais, os colegas, o professor, o time de futebol, diferentes comidas, o abecedário e palavras-chave, como "sim", "não", "sede", "banheiro", "entrar", "sair" etc. Assim, para indicar o que quer ou o que sente, o aluno aponta para as figuras.

Em alguns casos, a criança com paralisia cerebral também precisa de um cuidador que a ajude a ir ao banheiro ou a tomar o lanche. Mas, vale lembrar, que todos devem estimular a autonomia da criança, respeitando suas dificuldades e explorando seus potenciais.

Revista Escola

Autismo

O autismo é um transtorno invasivo do desenvolvimento, isto é, algo que faz parte da constituição do indivíduo e afeta a sua evolução. Caracteriza-se por alterações na interação social, na comunicação e no comportamento. Manifesta-se antes dos 3 anos e persiste durante a vida adulta. Há outros distúrbios do desenvolvimento que se enquadram no perfil de problemas autísticos, mas que não incluem todas as características da doença.

Basicamente, quatro fatores indicam a presença do autismo infantil: problemas de relacionamento social, dificuldade de comunicação, atividades e interesses restritos e repetitivos e início precoce.

Relacionamentos

A criança autista tem dificuldade em se relacionar com outros indivíduos. Assim, mantém-se distante, evita o contato visual, demonstra falta de interesse pelas pessoas e não procura conforto quando se machuca. Em 50% dos casos, o interesse social se desenvolve com o tempo, mas a reatividade, a reciprocidade e a capacidade de empatia permanecem prejudicadas. O autista tem dificuldade em ajustar seu comportamento ao contexto social e não consegue reconhecer ou responder adequadamente às emoções dos demais.

É comum, porém, que a criança tenha proximidade com os pais, desenvolvendo inclusive a afeição, mas é mais propensa a abraçar do que a aceitar ser abraçada. As interações sociais com os pares são restritas. Mesmo autistas adultos têm habilidade limitada de fazer amizades íntimas.

Comunicação

A dificuldade de comunicação afeta a compreensão e a expressão, o gestual e a linguagem falada. Metade dos autistas não conseguem desenvolver uma fala compreensível; a outra metade mantém atrasos nessa área. Uma minoria aprende palavras e até frases no período apropriado, mas depois perdem essa habilidade.

Quando a expressão verbal é desenvolvida, é tipicamente diferenciada e atrasada, com ritmo e entonações anormais. O indivíduo costuma repetir palavras ou frases (ecolalia), cometer erros de reversão pronominal (troca do “você” pelo “eu”), usar as palavras de maneira própria (idiossincrática), inventar palavras (neologismos), usar frases prontas e questionar repetitivamente. Normalmente o autista não mantém uma conversação, simplesmente fala para outra pessoa. Alguns usam a expressão verbal apenas para pedir coisas; outros, não percebem que o ouvinte não tem mais interesse no assunto. Os gestos são reduzidos e pouco integrados ao que está sendo dito. Metade das crianças autistas desenvolve uma fala compreensível até os 5 anos. Aquelas que não o tenham feito, dificilmente terão uma expressão verbal apropriada.

Interesses

Com relação às suas atividades e interesses, os autistas são resistentes a mudanças e mantêm rotinas e rituais. É comum insistirem em determinados movimentos, como abanar as mãos e rodopiar. Preferem brincadeiras de ordenamento (alinhamento de objetos, por exemplo) e têm fascinação por objetos ou elementos inusitados para uma criança (zíperes e cabelos, por exemplo). Costumam preocupar-se excessivamente com temas restritos, como horários fixos de determinadas atividades ou compromissos. Dificilmente brincam de faz-de-conta e quando isso ocorre, limitam-se a ações simples de um ou dois episódios histórias ou programas de TV favoritos.

Apesar de ser dificilmente detectada no primeiro ano de vida, a doença pode se manifestar nesse período, caracterizada por um desenvolvimento anormal. Um dos sinais é a aversão ao colo. Em casos raros, a partir de uma certa idade, a criança entra numa fase de regressão e perde habilidades de interação social e comunicação adquiridas nos primeiros anos de vida.

Prevalência

Duas em cada mil crianças têm algum distúrbio autístico. Dessas, de 10% a 50% são portadoras do autismo infantil (a variação percentual decorre das diferentes formas de classificação da doença). A doença atinge aproximadamente 0,05% da população, e a ocorrência de novos casos é mais comum no sexo masculino, na razão de três homens para cada mulher afetada. Não há uma clara relação entre o autismo e a classe sócio-econômica, apesar de estudos mais antigos apoiarem essa teoria.

O retardo mental afeta a maioria dos autistas. Cerca de 50% dos portadores do distúrbio têm quociente de inteligência (QI) inferior a 50; 70%, menor que 70; e 95%, abaixo de 100. Como a fala nesses indivíduos é normalmente prejudicada, a avaliação do QI é feita com testes não-verbais. Autistas com retardo mental são propensos a se automutilar, batendo com a cabeça ou mordendo a mão, por exemplo.

Outros sintomas

Um terço dos autistas com retardo mental sofrem crises convulsivas, que começam a se manifestar dos 11 aos 14 anos. Mas o problema também afeta 5% dos autistas com QI normal. Além disso, muitas crianças autistas apresentam problemas comportamentais ou emocionais. A hiperatividade é freqüente, mas pode desaparecer na adolescência e ser substituída pela inércia. A irritabilidade também é comum e costuma ser desencadeada pela dificuldade de expressão ou pela interferência nos rituais e rotinas próprios do indivíduo. A alimentação em exagero é uma forma de comportamento ritualístico. O autista também pode desenvolver medos intensos, que desencadeiam fobias.

Cerca de 10% dos autistas perdem habilidades de linguagem e intelectuais na adolescência. O declínio não é progressivo, mas as capacidade intelectual perdida geralmente não é recuperada.

Na vida adulta, quase 10% dos autistas trabalham e são capazes de se cuidar. Raramente mantém bons amigos, casam-se ou tornam-se pais. Crianças com um QI inferior a 60 provavelmente se tornarão dependentes na vida adulta. Entretanto, quando o QI é mais alto e a fala é compreensível, os autistas têm 50% de chance de desenvolver um bom desempenho social.

Origem

Uma grande variedade de distúrbios relacionados ao autismo foram reportados na literatura médica. Para a maioria das crianças autistas sem uma disfunção correlata, as causas ligadas a fatores genéticos são as mais prováveis. Estudos com gêmeos sugerem que a hereditariedade está intimamente ligada ao transtorno e que a origem esteja numa combinação de genes, e não em um único gene isolado.

A taxa de recorrência de autismo entre irmãos é de aproximadamente 3% e varia de 10% a 20% para as formas variantes da doença. Nos casos de autismo associado a retardo mental profundo e severo, as causas podem estar mais ligadas a danos cerebrais do que a fatores genéticos.

Não há evidências de que problemas psicossociais ou eventos traumáticos na infância, como desatenção dos pais, influenciem o surgimento do autismo. Há duas teorias principais sobre a causa do autismo, nenhuma delas comprovada. A primeira sugere que o problema original está na incapacidade do autista de perceber que há diferenças entre seu estado mental e o dos outros. Assim, o indivíduo teria dificuldade em ver o ponto de vista dos demais, mas seria capaz de compreender ações mecânicas e comportamentais dos objetos e das pessoas. A outra hipótese diz respeito à função executiva do indivíduo, que geraria dificuldades de planejamento e organização.

Tratamentos

O tratamento mais adequado para crianças autistas inclui escolas especializadas e apoio dos pais. Elas geralmente se desenvolvem melhor em instituições educacionais bem estruturadas, em que professores têm experiência com autismo. Programas comportamentais podem reduzir a irritabilidade, os acessos de agressividade, os medos e os rituais, assim como promover um desenvolvimento mais apropriado.

Medicamentos que agem sobre o psiquismo não controlam os principais sintomas do autismo, mas podem atenuar os sintomas associados. Estimulantes são capazes de reduzir a hiperatividade, mas geralmente aumentam de forma intolerável os atos repetitivos. Doses baixas de neurolépticos costumam reduzir a agitação e as repetições e em dosagens mais altas podem reduzir a hiperatividade, a retração e a instabilidade emocional. No entanto, é preciso verificar se o benefício é superior aos problemas causados pelos efeitos colaterais dessas drogas.

Texto: Solange Henriques

Fontes: GOODMAN, Robert e SCOTT, Stephen: “Child Psychiatry” (Blackwell Science, 1997) e Bacy Fleitlich Bilyk, mestre e doutora em Psiquiatria Infantil pela Universidade de Londres e coordenadora do Projeto de Atendimento, Ensino e Pesquisa em Transtornos Alimentares na Infância e na Adolescência (PROTAD) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

Síndrome de Angelman


A síndrome de Angelman foi descrita em 1965 por Harry Angelman, que verificou a existência do distúrbio em crianças com retardamento mental grave e crises de riso. Caracteriza-se clinicamente por baixo tônus muscular (hipotonia), atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (demora para começar a sentar, engatinhar, caminhar e falar), retardamento mental grave, ausência de fala e convulsões.

As crises de espasmos iniciam-se por volta de 1 ano e meio. Costumam ser acompanhadas de febres altas, que podem ser controladas e desaparecer com o tempo. Outras características importantes são incapacidade de coordenar movimentos musculares voluntários (ataxia), acessos de risos (provocados ou não) e secreção excessiva de saliva (sialorréia).

Fisicamente, os portadores da síndrome têm boca grande, queixo proeminente, dentes espaçados e língua protusa. A forma de caminhar é típica: os passos são largos e o andar ocorre aos trancos (espasmódicos), com os braços flexionados e as mãos caídas. A criança começa a andar somente por volta dos 3 ou 4 anos de idade. Algumas podem apresentar distúrbios de sono, hiperatividade, comportamento agressivo e cor da pele mais clara que a dos pais (hipopigmentação).

Sinais comportamentais

A observação do comportamento da criança é de grande ajuda no diagnóstico das mais novas, em que as características faciais ainda são pouco reveladoras. Os portadores têm aspecto sorridente e riem com freqüência, mesmo quando o estímulo é mínimo. Ao gargalhar, costumam abanar as mãos, o que também ocorre em momentos de excitação.

Além disso, crianças com a síndrome gostam de brincar com a água e apreciam barulho e imagens refletidas em espelhos. Algumas conseguem realizar sozinhas tarefas como comer, ir ao banheiro durante o dia, vestir-se com ajuda e executar tarefas domésticas simples. Outras conseguem pronunciar poucas palavras (geralmente três ou quatro), mas a maioria aprende a comunicar-se apenas por gestos ou sinais.

Incidência

A incidência da síndrome de Angelman é estimada em um caso a cada 20 mil indivíduos. Entretanto, há relatos de pacientes que apresentam quadro clínico moderado, com características comportamentais mais sutis. Como esses portadores possivelmente não são diagnosticados, o índice de ocorrência do distúrbio pode estar subestimado.

Causas

Da mesma forma que a síndrome de Prader-Willi, a síndrome de Angelman é decorrente de uma falha genética no cromossomo 15. Neste caso, porém, o problema é causado pela ausência de uma região de origem materna, denominada SPW/AS, nesse cromossomo. Como resultado, há perda da expressão de determinada informação genética que é transmitida pela mãe, e não pelo pai, como ocorre na síndrome de Prader-Willi.

A confirmação do diagnóstico da síndrome de Angelman é feita por teste clínico e genético. Este último baseia-se em estudos de DNA, que identificam a ausência da contribuição materna na região SPW/SA do cromossomo 15. As técnicas usadas permitem detectar 85% dos casos. O índice de acerto não é maior porque alguns pacientes com características da síndrome não apresentam os mecanismos genéticos, conhecidos até agora, que determinam o distúrbio. Nesses casos, o diagnóstico é essencialmente clínico.

Diagnóstico

Deve-se investigar a presença da síndrome de Angelman em crianças com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor de causa desconhecida. Além disso, a combinação de características faciais, grave retardamento mental, ataxia, convulsão e o semblante feliz sugere o diagnóstico da doença, que é confirmado por estudos moleculares.

Em geral, a síndrome passa desapercebida no primeiro ano de vida e é reconhecida por volta dos 3 ou 4 anos. Alguns sintomas, como convulsões, crises de risadas, boca grande, queixo proeminente e andar descoordenado tornam-se mais evidentes após os 2 anos. Outros sinais, como face assimétrica e escoliose, costumam aparecer somente na puberdade. O estudo do eletroencefalograma (EEG) pode ser útil no diagnóstico, mas algumas evidências da doença dependem da idade do portador e podem não estar presentes em crianças mais velhas.

Os progenitores dos pacientes apresentam risco de recorrência que pode variar de 1% a 50%, dependendo do mecanismo genético envolvido na origem do problema. Há relatos de portadores na mesma família que não apresentam anomalias cromossômicas. Além disso, o diagnóstico não pode ser confirmado geneticamente em cerca de 15% dos pacientes. Por isso, é sempre necessária uma avaliação clínica precisa, baseada no histórico e em características físicas (fenotípicas) e comportamentais do indivíduo.

Síndrome de Rett

Os sintomas da síndrome de Angelman muitas vezes se confundem com os da síndrome de Rett, uma doença neurológica que causa retardamento mental grave em meninas. Por isso, antes do diagnóstico conclusivo da síndrome de Angelman, é preciso diferenciá-la desta da outra enfermidade, e até mesmo de outros distúrbios com características semelhantes.

Pacientes com síndrome de Rett têm desenvolvimento normal até 6 ou 18 meses de idade. Depois, entram em um período de regressão e perda das habilidades motoras e mentais. Os sintomas incluem perda gradual da fala e do uso intencional das mãos, crescimento reduzido da cabeça (microcefalia), convulsões, ataxia, desligamento da realidade exterior (autismo), aumentos intermitentes da quantidade de ar nos pulmões (hiperventilação) e movimentação repetitiva e anormal das mãos. Após a regressão inicial, a doença estabiliza-se e, geralmente, as crianças sobrevivem até a idade adulta.

A principal característica que distingue os dois distúrbios é a regressão com perda de habilidades adquiridas em meninas com síndrome de Rett. Crianças com síndrome de Angelman nunca chegam a adquirir certas funções ou começam a executá-las tardiamente.

Cintia Fridman é docente no Departamento de Medicina Legal, Ética Médica e Medicina Social e do Trabalho na FMUSP e colaboradora no Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP (LIM-27)