quinta-feira, 19 de maio de 2011

Mutismo Seltivo-parte 2

Todos nós compartilhamos os medos, tristeza, frustração, obstáculos e alegrias criados pelo Mutismo Seletivo. Todos nós aprendemos dele e sobre ele, que nos leva por novos caminhos e viagens. Sentimo-nos compelidos a falar a nossos filhos, a ir mais além de ser simplesmente pais “normais”, para nos transformar em “especiais”, mais sábios, mais observadores, mais empáticos, mais sensíveis também. É impossível que sigamos sendo os mesmos, imutáveis, enquanto tenhamos um filho com Mutismo Seletivo.

Esta não é a primeira vez que falo como o Mutismo Seletivo – e de formas diferentes de muitos outros obstáculos na vida ou circunstâncias relacionadas à saúde mental – se apresenta como um instrumento e desculpa utilizada pela vida para nos pressionar de diversos modos, muito mais que aqueles que não enfrentam uma situação como esta. Na verdade, poderia e deveria se transformar em uma bênção, uma fonte profunda de crescimento e sapiência, fortaleza e esperança.

Cada ser humano é único, como cada família e sociedade o são, como qualquer outro sistema; não existe sequer um ser exatamente igual ao outro, e é isso o que faz nossa experiência tão rica. No entanto, existem emoções universais, valores, necessidades e experiências que todos nós compartilhamos de uma forma ou outra, e é isso o que nos ajuda a que nos entendamos uns aos outros, que nos capacita a contemplar diferentes pontos de vista e compartilhar em grupos sociais, criando culturas, criando significado e plenitude também.

Não há dúvida que dependendo de quão hábil e harmoniosa seja uma família, as crianças com Mutismo Seletivo experimentarão um caminho mais ou menos difícil nos processos de autodescobrimento e expressão de si mesmos. É a qualidade e consistência do apoio que uma pessoa com Mutismo Seletivo recebe, o que poderia fazer a diferença entre o promover a cura ou a desesperança, fortaleza ou maior ansiedade, fortalecimento ou exclusão.

Se você, como pai, vê a que a ajuda “profissional” não está sendo eficaz de uma forma ou outra, então faça algo a respeito. Converse, dialogue, explore enfoques alternativos para que aqueles profissionais possam apoiar melhor a sua filha, a você como pai, a sua família, e àqueles que estão conectados a ela de maneira mais próxima, como professores e pessoal da escola. Não seja passivo e sim, tome ações imediatas e consistentes, apontando mudanças e melhoras reais. Seja paciente, é essencial, mas não passivo. Se se faz necessário que uma criança vá a outra escola onde possa recomeçar sua vida escolar e social, então acolha tal opção e siga em frente. Se a administração e pessoal docente do colégio atual não estão dispostos e não são capazes de oferecer o respeito, empatia, compreensão e apoio necessários, e você tentou da melhor forma possível para motivar as mudanças e não encontrou mais que resistência e rejeição à ajuda, então siga adiante e procure um melhor lugar para sua filha.

Quando não há outro lugar, uma melhor escola, então é necessário enfocar todos os esforços em iniciar e apoiar mudanças nessa escola. Sua filha necessita sua ajuda, e cada dia de trabalho neste apoio valerá a pena. No entanto lembre-se, se depois de haver trabalhado tanto, vê que o desfavorável supera o positivo que haja sido conseguido, amplie suas opções e considere soluções alternativas. Se tiver que se mudar para que assim sua filha possa ir a uma melhor escola, então mude-se. Não seja impulsivo. Não se trata de fazer coisas de forma aloucada sem o planejamento suficiente, avaliando todas as consequências e obstáculos que terá que enfrentar. Tenha os pés no chão, seja objetivo, estabeleça suas prioridades e escolha a partir daí.

Decidimos – há pouco mais de um ano – que nossa filha iria a uma Escola Católica grande, já que chegamos muito tarde do exterior e já não haviam vagas em outras escolas locais, além do que acreditamos que o prestígio de tal colégio asseguraria uma boa educação e apoio para nossa pequena. A experiência provou que estávamos errados ao chegar a tal conclusão. De qualquer forma, não tivemos alternativas naquele momento.

Aqueles que nos vêm acompanhando através deste site, sabem que não foi fácil em absoluto. Lutamos e ficamos muito tristes e frustrados. Entretanto, este não foi o final da história.

Lembram como em um artigo anterior compartilhamos quão esperançados e entusiasmados nos sentíamos pelos planos de Carmencita, cheios de vontade e esforço para começar este novo ano escolar em uma nova e pequena escola, onde ela falaria aos professores e estudantes? E como ansiávamos por que tal plano se tornasse realidade? Pois bem, aconteceu! Levou tempo, mas finalmente conseguimos e começamos a ver como uma realidade concreta, uma que estamos certos continuará melhorando com o tempo.

Há poucos dias recebemos outra mensagem nos felicitando pelos progressos de Carmencita e compartihando como a filha desta pessoa também começou a falar na escola, sentindo-se literalmente plena pela alegria que uma melhora tão dramática traz a todo pai cuidadoso.

Novamente, não tenham medo de provar coisas novas, a mudar algo depois de ter trabalhado tanto e descobrir que não vale a pena continuar tentando. Muitas vezes os pais não podem ter um “segundo trabalho” a meio tempo tratando de educar e vigiar o cumprimento de toda uma escola, buscando a que os professores sejam ao menos respeitosos e agradáveis, quando não são empáticos, nem sábios com relação aos estudantes com Mutismo Seletivo. Enfatizamos, uma vez mais, que muitas instituições que oferecem uma educação mais personalizada, com enfoques menos rígidos e dogmáticos, sem egos institucionais excessivos e expectativas distorcionadas, transformam-se nos melhores lugares para uma criança com Mutismo Seletivo. Com certeza, um professor gentil e competente pode fazer a diferença, mas necessitará o apoio de seu sistema escolar para que os esforços sejam viáveis e frutíferos. Sabemos, como pais, como uma pessoa má em uma escola ou um estudante abusador podem facilmente detonar e alimentar muita ansiedade em nossos filhos, a tal ponto que não desejamos arriscar a exposição a tais situações. Ou sim?

Obrigado por percorrer este caminho conosco.


Como são as Terapias Adequadas para o Mutismo Seletivo?

“Minha filha de 4 anos acaba de ser diagnosticada com M.S., há pouco começou com as terapias, mas gostaria de saber como são as adequadas para este tipo de desordem”.

Com relação a sua consulta é esperançoso saber que assim que diagnosticaram o M.S. em sua filhinha começaram com a ajuda profissional imediatamente, já que isso é o ideal. Quanto mais cedo a intervenção profissional juntamente à educação de pais, família e pessoal educativo relacionado à criança, melhor para poder conseguir resultados positivos e evitar maiores complicações.

Em artigos prévios falamos de como a criança vai aprendendo e se acostumando a não falar, e também a reforçar as condutas e pensamentos em resposta à ansiedade no que chamamos de M.S. Podemos dizer que estas condutas-pensamentos-emoções se transformam em mecanismos de defesa para evitar a ansiedade, mecanismos que com o passar dos dias, semanas, meses e anos se tornam predominantes, muito fortes, difíceis de vencer e passam a formar parte da identidade que a criança desenvolve de si mesma, como também da imagem que projeta e da forma como os demais, começando pelos pais e familiares, o vêem. Isso, muitas vezes, não faz senão alimentar um círculo vicioso do qual é cada vez mais difícil sair, para a criança e aquelas pessoas ligadas a ela.

As “terapias” variam segundo o enfoque terapêutico do profissional e as próprias técnicas que este implemente. Em termos gerais podemos dizer que dentro daquelas que devem ser incluídas, segundo o que até o dia de hoje sabemos que funciona para ajudar a pessoas com M.S., encontramos a terapia cognitiva-condutual, a qual se enfoca em modificar ou melhorar o pensamento, crenças e idealismos da pessoa com relação a si mesma, a sua ansiedade e a como enfrentá-la e controlá-la. Embora seja certo que a ansiedade não respeita nem obedece totalmente ao intelecto, é possível reeducar a pessoa a modificar suas crenças e o padrão de pensamento que leva e alimenta a ansiedade. Na medida em que novas crenças e pensamentos são introduzidos na mente da pessoa, estes vão sendo reforçados e assim, assimilados emocionamente também, o qual possibilita uma mudança e melhoria em condutas e reações-respostas, incluindo aquelas necessárias frente à ansiedade.

Não há como descrever em poucas linhas, a detalhe, todos os enfoques psicológicos que podem ser utilizados para apoiar à pessoa com M.S., no entanto, podemos dizer que junto à terapia cognitivo-condutual existem aquelas “centralizadas no cliente ou na pessoa”, a qual provêm das escolas humanistas da psicologia, as que contemplam ao ser humano como um ser único, sensível, realmente humano, pelo que as terapias são sumamente conscientes e sensíveis a respeitar, apoiar e promover a individualidade de cada um, desde sua exploração e compreensão, até seu tratamento. Quantas vezes reclamamos, por exemplo, da frialdade, rapidez e mecanicismo que um profissional da saúde nos “vê” ou “atende”? Lhes é familiar a sensação de ser tratado como um a mais na lista de espera ou como um “paciente” ao que se diz o que se tem que fazer sem escutá-lo, conhecê-lo, nem empatizar com ele realmente? Pois quando se trata da saúde mental, e mais ainda de uma condição como o M.S., o profissional deve ser e possuir estas qualidades humanas, e de competência humanista de boa empatia, sensibilidade, cuidado real e preocupação pela pessoa, de aprender de sua vivência e situação em lugar de implantar um método geral descartando todas as necessidades e expectativas peculiares deste cliente-pessoa em particular.

Para adultos, a psicoterapia da “fala” pode ser muito útil, mas para crianças resulta muitas vezes, limitada, se não é ajustada completamente à idade, desenvolvimento e individualidade da criança, é por isso que ao se tratar de crianças a terapia do jogo é fundamental, como seu dinamismo quando se usam outros enfoques e técnicas, sejam congnitivas, condutuais ou humanistas. Sendo assim, você veria ao terapeuta literalmente brincando com sua criança, usando o jogo como meio de exploração, de comunicação, de partilha, para assim criar uma “aliança terapêutica” adequada, essa confiança e o sentir-se cômodo e seguro a tal ponto de poder abrir-se, estar presente e compartilhar o que passa dentro de si. Neste caso, através do jogo, da atividade lúdica. Existem assim a terapia da caixa de areia, jogo com bonecos ou marionetes, jogos de mesa e aqueles que são os chamados “jogos terapêuticos”, que são exclusivamente desenhados para a psicoterapia com crianças, púberes e adolescentes.

Não quero deixar passar o importante e ideal do ensinamento e o treinamento da criança-cliente em habilidades de relaxamento e controle de ansiedade. Isso se consegue com o adestramento em técnicas de relaxamento, meditação, atenção e similares, adequadas apropriadamente à idade do cliente e a suas preferências e aptidões pessoais.

O terapeuta irá estimulando a confiança e estima do cliente, incluindo imagem pessoal, até habilidades de expressão e comunicação verbal e não verbal; reforçando todo o avanço gradual, emboura pausado, trabalhando colateralmente com pais e educadores para continuar tais ações terapêuticas, consolidá-las e inclusive para implementar técnicas em casa, escola e outros ambientes sociais onde a criança requeira apoio e estimulação diretas.

Nas sessões de terapia, muitas vezes se começará trabalhando com a presença da mãe ou do pai, ou de qualquer outro familar que goze da confiança da criança para mediar a comunicação e criar o ambiente confortável. Podemos dizer que o terapeuta joga, inicialmente, um papel de espectador na dinâmica criada entre o familiar e o cliente-criança, para logo se tornar mais ativo, uma vez ganhe a confiança do cliente.

Pouco a pouco se deverá incluir a outras pessoas, gradualmente, que representem ou criem ansiedade na criança. Idealmente falamos da professora, pessoa com a que a criança interaja de forma silenciosa em maior ou menor medida. As terapias assim também deverão levar-se a cabo não exclusivamente no consultório, mas também na casa da criança, escola onde estude ou creche. Estes são lugares que representam um maior ou menor nível de comodidade, segurança e confiança-ansiedade para a criança, portanto seu uso flexível e pertinente por parte do terapeuta e dos demais profissionais e pessoas envolvidas na terapia deverá ser tomado em conta.

Nos próximos artigos desenvolveremos um pouco mais do tema, que sem dúvida é de sumo interesse e necessidade de todos os envolvidos com o M.S. Quero terminar recordando uma vez mais a importância que tem a própria relação no emocional e vivencial da criança-pessoa com o M.S. com aqueles que o rodeiam, começando por pais, educadores e profissionais da saúde mental e verão como o monstro da ansiedade, medo e incerteza desaparecerão.


Instituto de Mutismo Seletivo

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