quinta-feira, 19 de maio de 2011

Síndrome de Angelman


A síndrome de Angelman foi descrita em 1965 por Harry Angelman, que verificou a existência do distúrbio em crianças com retardamento mental grave e crises de riso. Caracteriza-se clinicamente por baixo tônus muscular (hipotonia), atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (demora para começar a sentar, engatinhar, caminhar e falar), retardamento mental grave, ausência de fala e convulsões.

As crises de espasmos iniciam-se por volta de 1 ano e meio. Costumam ser acompanhadas de febres altas, que podem ser controladas e desaparecer com o tempo. Outras características importantes são incapacidade de coordenar movimentos musculares voluntários (ataxia), acessos de risos (provocados ou não) e secreção excessiva de saliva (sialorréia).

Fisicamente, os portadores da síndrome têm boca grande, queixo proeminente, dentes espaçados e língua protusa. A forma de caminhar é típica: os passos são largos e o andar ocorre aos trancos (espasmódicos), com os braços flexionados e as mãos caídas. A criança começa a andar somente por volta dos 3 ou 4 anos de idade. Algumas podem apresentar distúrbios de sono, hiperatividade, comportamento agressivo e cor da pele mais clara que a dos pais (hipopigmentação).

Sinais comportamentais

A observação do comportamento da criança é de grande ajuda no diagnóstico das mais novas, em que as características faciais ainda são pouco reveladoras. Os portadores têm aspecto sorridente e riem com freqüência, mesmo quando o estímulo é mínimo. Ao gargalhar, costumam abanar as mãos, o que também ocorre em momentos de excitação.

Além disso, crianças com a síndrome gostam de brincar com a água e apreciam barulho e imagens refletidas em espelhos. Algumas conseguem realizar sozinhas tarefas como comer, ir ao banheiro durante o dia, vestir-se com ajuda e executar tarefas domésticas simples. Outras conseguem pronunciar poucas palavras (geralmente três ou quatro), mas a maioria aprende a comunicar-se apenas por gestos ou sinais.

Incidência

A incidência da síndrome de Angelman é estimada em um caso a cada 20 mil indivíduos. Entretanto, há relatos de pacientes que apresentam quadro clínico moderado, com características comportamentais mais sutis. Como esses portadores possivelmente não são diagnosticados, o índice de ocorrência do distúrbio pode estar subestimado.

Causas

Da mesma forma que a síndrome de Prader-Willi, a síndrome de Angelman é decorrente de uma falha genética no cromossomo 15. Neste caso, porém, o problema é causado pela ausência de uma região de origem materna, denominada SPW/AS, nesse cromossomo. Como resultado, há perda da expressão de determinada informação genética que é transmitida pela mãe, e não pelo pai, como ocorre na síndrome de Prader-Willi.

A confirmação do diagnóstico da síndrome de Angelman é feita por teste clínico e genético. Este último baseia-se em estudos de DNA, que identificam a ausência da contribuição materna na região SPW/SA do cromossomo 15. As técnicas usadas permitem detectar 85% dos casos. O índice de acerto não é maior porque alguns pacientes com características da síndrome não apresentam os mecanismos genéticos, conhecidos até agora, que determinam o distúrbio. Nesses casos, o diagnóstico é essencialmente clínico.

Diagnóstico

Deve-se investigar a presença da síndrome de Angelman em crianças com atraso no desenvolvimento neuropsicomotor de causa desconhecida. Além disso, a combinação de características faciais, grave retardamento mental, ataxia, convulsão e o semblante feliz sugere o diagnóstico da doença, que é confirmado por estudos moleculares.

Em geral, a síndrome passa desapercebida no primeiro ano de vida e é reconhecida por volta dos 3 ou 4 anos. Alguns sintomas, como convulsões, crises de risadas, boca grande, queixo proeminente e andar descoordenado tornam-se mais evidentes após os 2 anos. Outros sinais, como face assimétrica e escoliose, costumam aparecer somente na puberdade. O estudo do eletroencefalograma (EEG) pode ser útil no diagnóstico, mas algumas evidências da doença dependem da idade do portador e podem não estar presentes em crianças mais velhas.

Os progenitores dos pacientes apresentam risco de recorrência que pode variar de 1% a 50%, dependendo do mecanismo genético envolvido na origem do problema. Há relatos de portadores na mesma família que não apresentam anomalias cromossômicas. Além disso, o diagnóstico não pode ser confirmado geneticamente em cerca de 15% dos pacientes. Por isso, é sempre necessária uma avaliação clínica precisa, baseada no histórico e em características físicas (fenotípicas) e comportamentais do indivíduo.

Síndrome de Rett

Os sintomas da síndrome de Angelman muitas vezes se confundem com os da síndrome de Rett, uma doença neurológica que causa retardamento mental grave em meninas. Por isso, antes do diagnóstico conclusivo da síndrome de Angelman, é preciso diferenciá-la desta da outra enfermidade, e até mesmo de outros distúrbios com características semelhantes.

Pacientes com síndrome de Rett têm desenvolvimento normal até 6 ou 18 meses de idade. Depois, entram em um período de regressão e perda das habilidades motoras e mentais. Os sintomas incluem perda gradual da fala e do uso intencional das mãos, crescimento reduzido da cabeça (microcefalia), convulsões, ataxia, desligamento da realidade exterior (autismo), aumentos intermitentes da quantidade de ar nos pulmões (hiperventilação) e movimentação repetitiva e anormal das mãos. Após a regressão inicial, a doença estabiliza-se e, geralmente, as crianças sobrevivem até a idade adulta.

A principal característica que distingue os dois distúrbios é a regressão com perda de habilidades adquiridas em meninas com síndrome de Rett. Crianças com síndrome de Angelman nunca chegam a adquirir certas funções ou começam a executá-las tardiamente.

Cintia Fridman é docente no Departamento de Medicina Legal, Ética Médica e Medicina Social e do Trabalho na FMUSP e colaboradora no Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP (LIM-27)

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